8.5.08

ENCONTRO

Ato I


Àquela hora da madrugada, quando os vampiros vagam soltos, voejando desatinados e, é questão de instantes, antes que, o primeiro raio de sol, os torne pó, secados aos limites o sangue, vital às veias e, só um ser, pulsante de vibrante juventude e saudável energia, poderá aplacar, fome de criatura, residente a eras na escuridão do desamor, largado lá, ferido, por frio e insensível franco atirador, tornando-o resistente, refratário à aproximação, servindo-se dos outros ao propósito a que servem, se servissem, pagando em igual moeda o que o corpo alude, amiúde, assim feito lobo uiva, faminto, na madrugada gelada.

Varrendo ventos vazantes, ao varar a vau da avenida, viu, de pronto, no ponto, fanicando, falena figura, farfalhando ao assoprar as mãos, tentativa de aquecê-las, esquecida em si, resvalando de um pé ao outro, revelando um balé ralentado, tratando com a transfusão de dirimir a inversão térmica, traduzida aos intragáveis três graus centígrados.

Atento a qualquer nave, quase ave, quase na neve, aventados corredores congelantes, reino ruminante, razoável à rapina, àquela hora, sorriu, quando, estancado veículo, aberto vidro por dispositivo, seu tripulante, ativo, tramou, como intróito:

- Quer uma carruagem ou, quem sabe, um trago da minha beberagem?

Voragem visionária, sem trastejar, tratou de entrar no bólido ígneo, fumarando da travessia através da estratosfera terrestre, sem travar nada nem sequer esperar um segundo aceno.

Selada e lacrada a porta, partiu o aparato e, o interior, cálido, acolheu-os.

Estendendo a mão, quente, ao contato da nua, crua, quase pedra, num augúrio, inquiriu:

- Chamas aqueçam teu nome! O que danças na rua, lanças para a lua?

- Tudo está refeito agora, o que será, seremos, porque o frio insana e, aludindo ao legítimo, partindo de você, nada de mal serei. Será íntimo, não é?

- É a mais pura vaidade, a vocação é fazer bem, mas espero resultantes, estamos acordados? Sei que nada é desgraça quando se está na praça, diga o preço.

- Mereço saber que não preciso me desandar em descobrir qual a gravidade do efeito dispensado, adentrar em desatino um covil sem aludir ao destino. Realmente entrego minha viagem à sua vivaz virtude. A partir deste lamento, não me faça revés, não te acusarei de aborrecimentos, nem te farei clamar intento, prometo.

- Louvo seu alento, mas não são, deveras, promessas severas demais para quem acabou de aportar?

- Atente ao meu parecer, pois se assim não for, perderei seu caminho e nosso tempo, porque para mim é assim ou vaga. Veja, sou de uma só lavra, e já tendo entronado outra vez, sonho adentrar quem seja como eu e tragar o coração.

-Não prometo que esqueças o que bebeu, mas se estamos nos sabendo, como a serpente o ovo, quero compactuar com a idade. Olhe para mim, note as marcas do vento no meu gosto e, os sabores que a vida me cansou. Jurei que não mais me lavaria a loucura, me atirando ao sério, mas, a avenida é cheia de reviravoltas e na quina da retorta te topei. Então, deixe que eu lude a lida e tu, a ida alude.

-Lancei a linha no lago, feito criança e, se sei levar o brinquedo, o sério seria pescar desta beira, trocando, te dou a isca e você, feito peixe, engole, assim ficamos fisgados e, como num rio remansado, remaremos ao calor.

- Seja para o que for, pode contar carneirinhos, serei pastor incondicional.

- Leal compartirei, já que o legado está legitimado, podemos lavrar nossa missiva, lançando-a ao infinito.

- Sem mais isto ou daquilo, somente um prelúdio, um acerto de desvãos, cujas prerrogativas são mais rentes. Sem pressa, presa, preme que chegues perto, quero ser seu valor.

- Vamos fazer melhor, que seja lírico como já o sinto onírico.

- Convocação aceita, estamos quase varando.

Vazando velhos sinais, deixados para trás, quais nocivas novenas, avistam altíssima torre, plantada em descampado, ornado de espécies esparsas, raras e rarefeita iluminação, vacuada por vasto vazio, se abre à aproximação a goela do subterrâneo.

Sucedâneo, digitalizada senha, elevam-se, sem subterfúgios nem tangimentos fúteis. Calados, num enleio, resvalando no ensejo, sem mais vazas, que aquelas, as que seus corpos crentes urgem e, caminhos sinceros, incisam relevar.

Como numa bolha, solta no espaço, a vista, vagando no ar, abre-se inteira, sobre as luzes, apagando-se no horizonte, mistura de céu e mar.

- Sem outra intenção, senão quebrar o gelo ou puro apelo posso te oferecer uma soda à moda ou outra vertigem, que nos esqueça do frio das noites solteiras.

- Inteiras viagens, menos visagens, porque prefiro saber na saliva da tua língua a doçura das tuas lavas e o suor vertido sal no sexo que seremos, preenchendo os rios lavrados, para que sejam bordados por mim, tal rei de um reino urdido a lanço que, diferente dos carteados por fadas, lilázes para gente, será aparvoado por hóstias fantásticas e miraculosas, como todos deveriam, serenos.

- Ser preso da surpresa, sem haver pensado nisso, vindo teso, despencado desta ladeira, é a maneira que seguiremos, sem escolta, nem quebrarmos a verdade dita, atingindo ditosos os azuis dos dias bem aventurados a serem digredidos.

- Idos tempos tristes. Dispamos agora as vestes vestais até que estejamos nus dos corpóreos véus, diante do vexame de sermos verdade, essência do que somos.

- Que não hajam mais barreiras, sombras, manchas do antes ou d’après-midi que impeçam que sejamos ligeiros, leves, diretos seres imaginosos, com o todo comungado.

- Amar na luz deste novo amanhecer, sei que é o que queremos, por isso compactuo com tamanha intimidade e calma, que saibamos somente nós.

Vamos vazar, sinta a tez.

Abraçados, enlevados, sentindo-se além dos laços do outro, lançam para a vida, para o dia, por estarem acordados, ensejos de que o mundo todo desperte entre bocejos e beijos e com a mesma predisposição predita.

- Louvar gloriosa manhã raiada!

- Bendito o vento que vestimos antes de estarmos inconclusos para o encontro.

- Hosana dias que virão.

Continua...

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